O mundo do futebol tem uma história, construída por homens e mulheres, na qual me orgulho de ter participado. No feminino, a paixão pela bola rompe barreiras, vontades e ideologias, dentro e fora das quatro linhas. Muito já foi feito, mas muito mais está por fazer, seja com uma bola nos pés, com um cartão na mão, a treinar uma equipa ou a liderar um clube.
E, antes que me rotule como feminista, gostaria que ficasse bem claro, que não defendo a ideia de que as mulheres são melhores do que os homens, nem que futebol é coisa para homem ou tão pouco que estes são mais capazes do que as mulheres. Considero apenas que somos diferentes e que, em campo ou fora dele, fazemos as mesmas atividades e funções, apenas e somente de forma diferente. Nem melhor, nem pior.
Uma visão que demorou anos a ganhar terreno. Apesar de as origens remontarem há 5 mil anos na China, segundo a FIFA, a primeira partida oficial entre mulheres foi disputada no dia 23 de março de 1885, em Crouch End, Londres, Inglaterra. No Brasil, por exemplo, apesar de os primeiros indícios disponíveis sobre um jogo de futebol feminino datarem de 1921, somente em 1983, cerca de 60 anos depois, a modalidade foi regulamentada e só em 1991 surge a primeira Copa do Mundo Fifa de Futebol Feminino.
No caso da arbitragem, por exemplo, somente em 2018, Sandra Bastos se tornou na primeira árbitra portuguesa num Mundial e em 2020, Vanessa Gomes foi a primeira árbitra assistente num jogo de futebol masculino profissional, após 13 anos de atividade.
Uma realidade que atravessa continentes e cujas conquistas se fazem com o amor à camisola. Li em tempos que, Pia Sundhage, atualmente, treinadora da Seleção Brasileira de Futebol Feminino e ex-futebolista sueca, em criança, teve de fingir ser um menino para jogar num campeonato, tendo-se tornado jogadora profissional aos 17 anos e destacado pelos resultados. Enquanto treinadora já ganhou, entre outros, dois ouros olímpicos, medalha de prata à frente da Seleção da Suécia nas Olimpíadas Rio 2016 e foi eleita a melhor treinadora de futebol feminino pela Fifa em 2012.
Por outro lado, ainda que em 2019, segundo a Federação Portuguesa de Futebol (FPF) fossem mais de dez mil as jogadoras federadas a praticar futebol e futsal, em Portugal (10028 inscritas, sendo 6020 em futebol e 4008 em futsal) e estejamos a assistir à ascensão das modalidades, existem áreas onde urge a presença em maior número de mulheres.
Uma delas é a área da gestão e a confirmar-se a diretiva europeia, cuja proposta foi lançada há 10 anos (a 14 de novembro de 2012), a partir de 30 de junho de 2026 passará a ser obrigatória a presença de mais mulheres nos cargos executivos das SADs dos clubes de futebol.
No que diz respeito a Portugal, sinto que está a ser desbravado caminho. No meu caso, por exemplo, fiz parte de um grupo pioneiro no âmbito de uma formação em liderança feminina no desporto, onde tive a honra de conhecer mulheres com garra como Carla Couto (considerada a melhor jogadora do século para a FPF) e Edite Fernandes (segunda mais internacional de sempre e melhor marcadora da seleção nacional), assim como mulheres sem uma bola nos pés, mas com a bandeira ao peito e com um potencial incrível. Mulheres cuja visão e capacidade de resposta permitem soluções diferentes e inovadoras (mais uma vez, nem melhores, nem piores das dos homens, apenas diferentes).
É consentâneo que a resiliência e as provas dadas por quem está no terreno, e Portugal tem muitos e excelentes exemplos, apesar de todas as dificuldades e desafios, transformaram-se em conquistas e em reconhecimento. Dentro e fora das quatro linhas, as mulheres têm marcado posições, arbitrado vontades e demonstrado, com os seus resultados e decisões, que também fazem falta e marcam a diferença no mundo da bola.
Maria João de Figueiredo
Financial Advisor