Ensino entre crianças pode desenvolver características como criatividade, inovação e trabalho colaborativo
A prática da educação empreendedora já foi incluída na Base Nacional Comum Curricular (BNCC), mas sua implementação ainda enfrenta dificuldades.
Uma nova pesquisa encomendada pelo Sebrae e a Fundação Roberto Marinho, e realizada pela Plano CDE ouvindo 605 profissionais de ensino, mostrou que 56% dos entrevistados ainda não tentaram aplicar essa metodologia em sala de aula.
Para 46% deles, a falta de tempo para inclusão desse tema no conteúdo obrigatório é o principal obstáculo (40% indicam a falta de interdisciplinaridade como uma das barreiras).
Em contrapartida, quase oito em cada dez professores (78%) estão interessados em aplicar educação empreendedora na sala de aula, e 86% deles estariam dispostos a aprender mais sobre o tema.
O que é empreendedorismo infantil
Na definição do Sebrae, entidade de apoio para pequenas empresas, o empreendedorismo na educação infantil tem como foco principal ser a base inicial para que as crianças fiquem aptas a resolver situações do dia a dia partindo de um ponto de vista mais amplo e de maneira proativa.
A ideia é que com esse tipo de desenvolvimento e estímulo os pequenos cresçam com uma cultura empreendedora enraizada em suas ações, trazendo mudanças necessárias para a sociedade como um todo.
Como ensinar empreendedorismo para crianças
Especialista em educação empreendedora e criador de um dos maiores programas de ensino de empreendedorismo do Brasil, adotado por cerca de 400 instituições do país, Fernando Dolabelaexplica que não é possível ensinar empreendedorismo, mas é possível aprendê-lo através do contágio social.“
O papel do professor é transformar a sala de aula em um ambiente em que o aluno desenvolva os conhecimentos que necessita para empreender: conceber o futuro que deseja e buscar meios para transformá-lo em realidade”, afirma. “A definição que eu criei diz que ‘o empreendedor é alguém que sonha, concebe o futuro, e busca transformá-lo em realidade, age para realizá-lo’.”
A metodologia “ pedagogia empreendedora ”, criada por Dolabela, atende a educação básica, de 4 a 17 anos, e é usada em 145 municípios brasileiros, envolvendo cerca de 10 mil professores e 400 mil alunos. É uma forma de ensinar, explica o especialista, que não é dirigida exclusivamente à criação de empresas.“
O seu objetivo é dinamizar o potencial empreendedor do aluno, semelhante a outros potenciais como falar, escrever, imaginar, correr etc., presente em todos os indivíduos da espécie humana”, diz. “A decisão de aplicá-lo para criar uma empresa ou para ser pesquisador é de cada aluno. Isso quer dizer que todos devem ser empreendedores, não importa o campo de atuação ou a relação de trabalho: artistas, empregados, políticos, religiosos, professores etc.”
Empreendedorismo na educação básica
Ele defende que, na educação básica, ainda há tempo de substituir a forte e antiga cultura do emprego pela cultura empreendedora — que serviria para todos, inclusive para os que não querem abrir o próprio negócio. “O ideal é que na educação básica o estudante conheça o que é empreendedorismo ”, diz.
“Ao chegar à universidade, e se aprofundar no conhecimento que lhe interessa, naturalmente estará em condições de criar uma empresa. A melhor contribuição da universidade será conectá-lo ao ecossistema empreendedor da sua área.”
Dolabela faz uma crítica à educação convencional, dizendo que ela “é um bloqueio ao desenvolvimento do potencial empreendedor presente em todos nós”. “Além de não dar espaço à formação empreendedora, a educação básica tradicional é um processo de ensino, enquanto o empreendedorismo é um processo de autoaprendizado.”
Ele lembra que empreendedores fazem coisas para aprender. Enquanto o erro no ensino convencional é punido, na educação empreendedora é visto como uma fonte importante de aprendizagem. “Dois temas essenciais ao empreendedor são descartados: o talento e a criatividade.”
Para o especialista, a função mais nobre da educação empreendedora é estimular as pessoas a descobrir e desenvolver seus talentos e paixões e torná-las utilizáveis.
“Quando uma cultura de um país abre mão dessa missão está renunciando aos seus principais tesouros: a capacidade que tem cada ser humano de transformar o mundo através da inovação e do empreendedorismo.”
Como apresentar o empreendedorismo para crianças
O próprio Sebrae, que encomendou o estudo ao Plano CDE, tem uma metodologia para ensinar empreendedorismo às crianças. Por meio do Centro Sebrae de Referência em Educação Empreendedora (CER), traz uma série de conteúdos que podem auxiliar os professores em sala de aula.
Para o CER, a capacidade de empreender está, antes de tudo, ligada ao desenvolvimento de algumas habilidades que fazem com que o cidadão esteja apto a agir em direção à realização de projetos transformadores.
Segundo a instituição, o empreendedorismo na educação infantil tem como foco principal ser a base inicial para que as crianças venham a estar aptas a resolver as situações do dia a dia partindo de um ponto de vista mais amplo e de maneira proativa.Desse ponto de vista, o CER lista alguns exemplos que podem servir como modelo a ser implantado em sala de aula:
1. Aposte em dinâmicas multidisciplinares
Uma das bases do empreendedorismo é a valorização das diversidades, fazendo com que elas se unam em prol da criação de uma ação inovadora. Para que isso seja aplicado em sala de aula, será importante que as crianças sejam estimuladas a observar o mundo ao seu redor. Então, cabe ao professor trazer temas que façam parte da realidade da turma, propondo um bate-papo educativo no qual a busca por melhorias será a finalidade desse debate.
2. Crie eventos que visem a arrecadação de fundos para ajudar alguma instituição de caridade da comunidade
As crianças podem ter a responsabilidade de participar da organização do evento. É preciso que os estudantes atuem também na fase do planejamento, oportunidade em que eles poderão expor suas ideias de forma livre, estimulando assim a comunicação. Tal atividade ajudará no desenvolvimento do senso de coletividade, da criatividade e também da liderança.
3. Utilize a tecnologia para a criação de um projeto online
Para empreender nos dias atuais, é preciso estar por dentro da tecnologia. As crianças possuem facilidade enorme para lidar e aprender a usar as ferramentas digitais. Os professores podem aproveitar essa familiaridade a fim de estimular o desenvolvimento de competências empreendedoras.
A internet tem um leque de opções para a criação de projetos. É possível que as redes sociais, por exemplo, sejam amplamente exploradas para o desenvolvimento de campanhas de divulgação de conteúdos. Caberia ao professor criar um canal de comunicação no qual os estudantes teriam papéis de protagonistas na entrega do conteúdo. Eles participariam ativamente das postagens, produzindo fotos, vídeos e até alguns textos com a ajuda dos professores.
4. Faça atividades que envolvam trabalhos manuais
Uma visão empreendedora inclui a capacidade de compreender a importância do trabalho para o sucesso dos projetos. Diante disso, nada mais justo do que trazer ações em que as crianças coloquem a “mão na massa”.
Os professores podem propor pequenas atividades nas quais os estudantes realizam a criação de peças que eles vão utilizar no dia a dia. Eles começarão a entender como o trabalho é importante, além de sentir na pele as dificuldades encontradas em cada etapa da montagem do objeto.
Fonte: EXAME